A incoerência da aplicação do critério de equidade, para fixar os honorários sucumbenciais, fora das situações previstas em lei.
22/04/2025

Como é de conhecimento da maioria, em todos os processos judiciais, exceto mandados de segurança, ao final há a condenação em honorários de sucumbência em favor do advogado da parte vencedora. Se uma das partes no processo for a Fazenda Pública (municipal, estadual ou federal), o Código de Processo Civil (CPC) determina que a fixação desses honorários siga os parâmetros de escalonamento previstos no artigo 85, parágrafo 3º, cujos percentuais variam entre 1% e 10%, a depender do valor envolvido na ação.
Tais critérios aplicam-se indistintamente, estando a Fazenda Pública na condição de vencida ou vencedora, todavia, sempre levando em consideração o trabalho desenvolvido pelo patrono da parte vencedora, para evitar condenações em patamares excessivos ou diminutos.
Tais critérios são objetivos e devem ser aplicados aos processos de conteúdo econômico líquido ou liquidável, ou seja, de valor já conhecido ou possível de sê-lo. Além disso, o escalonamento previsto nessa norma limita a atuação discricionária do magistrado à definição de um percentual dentro das faixas, mínima e máxima, já ali previstas. Tudo para conferir previsibilidade e segurança jurídica.
Há situações, contudo, em que o valor envolvido na demanda é inestimável ou irrisório, para as quais o CPC permite a apreciação equitativa do juiz.
A “apreciação equitativa” se refere a uma modalidade de arbitramento de honorários baseada na proporcionalidade, na razoabilidade e no bom senso. Mas, também, não significa completa liberdade do magistrado; mesmo nesta hipótese, o CPC trouxe alguns parâmetros para orientar o julgador, em especial o parágrafo 8º-A do artigo 85, incluído pela Lei nº 14.365/2022, que determina a observância aos valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil ou o limite mínimo de 10%, o que for maior.
Portanto, a partir da edição da referida lei, já existe um piso mínimo de valor de honorários sucumbenciais, quando fixados pelo critério da equidade. Isto significa que, nos casos que envolvam a Fazenda Pública, esse mínimo pode ser superior àquele que seria fixado com base no escalonamento previsto no parágrafo 3º do mesmo artigo 85.
Melhor explicando: nos processos envolvendo a Fazenda Pública, o artigo 85 do CPC prevê um critério objetivo (parágrafo 3º) para as causas de valor líquido ou liquidável e um critério subjetivo (parágrafos 8º e 8º-A) para as causas de valor inestimável ou irrisório.
Logo, é incoerente a aplicação do critério subjetivo (equidade) nas causas de valores tidos por “exorbitantes”. Afinal, o objetivo da apreciação equitativa do juiz não é apenas evitar a fixação de verba honorária em valor irrisório, mas também conter a possibilidade de situação inversa.
-Esse foi o racional assentado pelo STJ no Tema nº 1.076:
“1) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação ou da causa, ou o proveito econômico da demanda, forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância dos percentuais previstos nos parágrafos 2º ou 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil (CPC) – a depender da presença da Fazenda Pública na lide –, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa.
2) Apenas se admite o arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo.”
Ocorre que a Fazenda Pública não se deu por satisfeita e recorreu desse entendimento, por meio do Recurso Extraordinário nº 1.412.069, no qual foi reconhecida a repercussão geral (Tema nº 1.255) e será analisado “se a fixação de honorários advocatícios contra a Fazenda Pública deve sempre e necessariamente ter por critérios os previstos nos parágrafos 3º a 6º do art. 85 do CPC – ou se, em determinados casos, cabe a aplicação do parágrafo 8º do referido dispositivo legal“.
Com isto, a situação ficou “perigosa” – para dizer o mínimo – nos processos que envolvem a Fazenda Pública, uma vez que, se for admitida a equidade (prevista no parágrafo 8º do artigo 85) para fixar os honorários nesses casos, será impossível escapar do piso mínimo apontado no parágrafo 8º-A, que é de 10% do valor da causa.
Isto significa que, em tese, o uso desse critério pode resultar em honorários muito superiores aos que seriam atingidos pelo uso do critério objetivo (previsto no parágrafo 3º do mesmo artigo). A nosso ver, uma completa irracionalidade (no dito popular: “um tiro no próprio pé”), além de desvirtuar a finalidade do instituto da equidade!
Espera-se que o STF, ao analisar o Tema nº 1.255, leve em consideração o conteúdo do parágrafo 8º-A do artigo 85 do CPC e reafirme o que já foi definido pelo STJ: a fixação dos honorários sucumbenciais em processos envolvendo a Fazenda Pública deve, obrigatoriamente, seguir os critérios objetivos previstos no parágrafo 3º daquele dispositivo, reservando-se a equidade para situações absolutamente excepcionais (valor irrisório), o que, aliás, atende ao comando do artigo 140, parágrafo único do CPC (“O juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei).
Portanto, é de extrema importância que os contribuintes litigantes no âmbito fiscal estejam bem assessorados, de modo que não sejam impelidos ao pagamento de honorários de sucumbência desarrazoados e ilegais.
Escrito pela advogada Caroline Martinez de Moura.
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